segunda-feira, 30 de maio de 2011

Esquizofrenias e realidades

De acordo com a lógica e a avaliar pelas sondagens (com as devidas reservas), todas as probabilidades apontam, a meio da campanha eleitoral, para a constituição de um futuro Governo PSD/CDS, com apoio parlamentar do PS – decorre do acordo de entendimento entre ‘troikas’ (a externa – UE/BCE/FMI – e a interna – PS/PSD/CDS), o já célebre memorando. Não obstante a resistência que o PS vem demonstrando nas sondagens, tudo parece determinado para esse há muito anunciado desfecho das eleições do próximo 5 de Junho. A alternativa menos provável – um Governo PS, com apoio parlamentar PSD/CDS – sem ser exactamente o mesmo, pouco divergiria da primeira solução no essencial do programa político a ser executado nos próximos três anos.

Temos, assim, um problema agravado, que o desenrolar desta campanha veio tornar mais consciente: já não bastava a aplicação do programa ‘em si’ da ‘troika’ para infernizar a vida às pessoas, como ainda, tudo o indica, a sua concretização vai ficar dependente das tergiversações de um líder que, para além do verbo fácil, ancorado num academismo plastificado, apenas se tem revelado excessivamente moldável às circunstâncias e, obviamente, aos interesses dos poderosos barões do PSD. Qualquer que seja o prisma, não deixa de ser um 'retrocesso histórico', pois ao absolutismo iluminista de Sócrates, apresta-se para lhe suceder o feudalismo medieval de Passos.

Analisada a questão a prazo – tanto ‘monarcas’ absolutos, quanto barões feudais, hoje dificilmente serão tolerados por muito tempo – até podia constituir uma boa notícia: um governo assim, liderado por um Passos Coelho cativo do baronato PSD, não vai durar muito! E livrávamo-nos de Sócrates, por agora o alvo incontestado a abater, para onde convergem todas as atenções de uma campanha esquizofrénica que recusa debater o essencial e se concentra nas picardias e incidentes – embora se saiba bem porquê!

O problema está nos ‘entretanto’ das pessoas que vêm as sua vidas esmagadas pela crise ou trucidadas na voragem experimentalista de um líder instável, debitando receitas de um academismo desumano e irrealista, bem como nos ‘finalmente’ da posição colectiva muito agravada que daí, por certo, irá resultar. Agravada mesmo que os indicadores relevantes para o sistema demonstrem reagir positivamente a tais medidas (à semelhança dos ‘Chicago boys’ no Chile de Pinochet?), pois as marcas nas alterações estruturais impostas para alcançar aquelas serão indeléveis na precariedade do trabalho, na regressão dos sistemas públicos de educação e saúde, no desmantelamento das redes de protecção social,...

Porque o essencial destas eleições, por mais que se disfarce, gira em torno do acordo de entendimento entre essas duas ‘troikas’ (a externa e a interna), vertido num memorando que até se demonstra difícil (que conveniente!) na fixação linguística. É isso que se encontra sempre presente na mente de todos, mesmo se apenas de forma implícita, seja qual for o assunto em debate ou desvio tentado. Ou quando se fixam psicoticamente no objectivo de apearem um personagem, não importando quem o substitua! Com isso apenas pretendem desviar (consciente ou inconscientemente) as atenções do essencial.

Porque o essencial, enfim, é o conteúdo acordado nesse memorando, formas (e meios) de o concretizar, expondo-se os custos envolvidos, ponderando-se a sua viabilidade; repercussões imediatas e a médio prazo no modo de vida das pessoas por força da sua aplicação; consideração (no mínimo) de eventuais alternativas (que as há) para debelar a ‘crise da dívida’ – afinal a origem (lembram-se?) destas eleições – pois a solução das ‘troikas’, está provado (e nem seria necessário o exemplo da Grécia), é o fracasso para além da ruína...

Apesar dos múltiplos e insistentes avisos lançados por insuspeitos e reputados especialistas mundiais (Roubini, Krugman, Stiglitz, Wolf,...) apontando, face às condições impostas de prazo e juros, a inevitabilidade da reestruturação da dívida – sobretudo a privada, bancos à cabeça (veremos se a solução não acabará por passar pela sua 'nacionalização'...) – o coro mediático dominante prefere insistir na fantasia da inevitabilidade de ter de se cumprir o memorando. Enquanto isso, a ‘queda’ da Grécia parece eminente e o efeito de arrasto, aqui sim, realmente inevitável, ameaça precipitar o mesmo destino sobre outros países.

Percebe-se – perceber-se-á então! – que a verdadeira alternativa e única realidade política, essa consuma-se entre os partidos da ‘troika’ do memorando (PS/PSD/CDS) e os tidos como marginais ao sistema, a esquerda que o recusa por inviável (e inútil), mas sobretudo ruinoso.

sábado, 28 de maio de 2011

Uma questão (de) "lógica" ...


Nota : especialmente dedicado a uns tantos Amigos que, ainda e agora, teimam em não perceber o óbvio ...
Quem sabe se até lá, dia 5 de Junho, não conseguirão perceber a lógica da "coisa" ???

domingo, 15 de maio de 2011

'Um dia a casa vem abaixo'!

A construção do edifício liberal de acordo com os parâmetros mais ortodoxos dos seus indefectíveis próceres está prestes a concluir-se, um pouco por toda a parte. Contra a lógica, aliás, que parecia ir resultar da crise financeira de 2008! A última etapa desta escalada galopante, entre nós, está já em curso e teve início com a chamada do Fundo Europeu de Resgate (FEEF/FMI, a famigerada ‘troika’), destinada a avalizar as derradeiras medidas que faltavam para completar a sua arquitectura!

Ainda agora foi divulgada uma recomendação constante de um parecer de 2010, encomendado pelo PSD (pois claro!), do denominado ‘pai’ (?) da TSU (professor de economia na Universidade Nova de Lisboa, só podia!), que aponta a necessidade de uma redução, no mínimo, para 12% da Taxa Social Única (TSU) – ou seja, para metade da actual (!) – como condição para que Portugal volte a ganhar competitividade!

A fórmula ‘milagrosa’ que justifica e comporta estas medidas denomina-se, na gíria liberal, de ‘desvalorização fiscal’ e visa essencialmente baixar de forma drástica os custos do trabalho, com estagnação (ou mesmo redução) dos salários. A forma de compensar a brutal perda de receitas originada pela redução da TSU, passa pelo aumento dos impostos sobre o consumo, o que permitiria resolver, no imediato, o déficit daí resultante e equilibrar as contas. A médio prazo, já se sabe, é a destruição pura e simples do Estado Social (considerado financeiramente insustentável) que se perspectiva e encontra já anunciada!

Percebe-se então que a aparente dissonância de posições sobre a baixa da TSU dentro do PSD, (ou entre este e os outros dois partidos que assinaram o ‘memorando da troika’, PS e CDS/PP), se insere num processo de gradual preparação para o desfecho há muito definido, que o ‘breviário’ liberal aplica de forma indistinta, quer se trate da Irlanda ou das ‘renovadas’ economias do Leste, tão pressurosas – percebe-se porquê! – na aplicação destas receitas. Afinal o objectivo não é os ‘4 pontos percentuais’ da polémica mediática com que nos têm vindo a entreter, ou até os mais ousados ‘8 pontos’ do desbocado Sr. Catroga, o objectivo é mesmo ‘12 pontos’! E ponto final!

A verdade é que a brutal transferência de rendimentos das pessoas para os grupos económicos, do trabalho para o capital, tem aqui mais um episódio relevante, na senda do que tem vindo a acontecer na longa saga da ‘dívida soberana’, com os especuladores – primeiro os particulares sem rosto, agora o rosto da ‘troika’ – a imporem, em nome da estabilidade financeira, as formas de uma violência sem nome, seja em benefício dos bancos alemães e franceses, ou dos ‘donos de Portugal’! Porque, importa reafirmá-lo sempre, o capital tem vindo a recompor-se das perdas da crise (o ‘lixo tóxico’) à custa da extorsão conseguida na base da austeridade que as políticas liberais têm conseguido impor por todo o lado, muito em particular nos países da periferia.

Dir-se-á que são estas as regras do sistema, o realismo político assim o impõe, que não é possível fugir do garrote da dívida externa, que se torna inevitável (!) cumprir o estabelecido no ‘memorando’. Mas como muitos economistas, da esquerda à direita, já concluíram e vêm afirmando, as condições nele estabelecidas conduzem a uma outra inevitabilidade: a de que ‘com estas perspectivas de recessão e estas taxas de juro, a dívida das periferias não é pagável. (J.M.Castro Caldas, in Ladrões de Bicicletas). A reestruturação da dívida, tornada assim inevitável, ficará então a aguardar que a Banca (nacional e internacional) complete a recomposição da sua tão abalada situação financeira!

Depois... Com a falência (ou redução ao mínimo) do Estado Social, a completa desregulação financeira (passado o susto de 2008, nenhum poder ousou mais pôr em causa os ‘off-shores’!), concluído o projecto de total liberalização económica da sociedade (varrida a intervenção do Estado), ficarão então eliminadas todas as barreiras e interferências externas à plena expressão do ‘mercado livre’ – incluindo a liberdade de explorar, poluir, delapidar, devastar, sem reservas nem limitações! O santuário da ‘liberdade de escolha’!

Antes, porém, já Mário Soares avisara: ‘Este capitalismo selvagem que nos domina, é preciso que desapareça’. O problema é que o capitalismo é selvagem por natureza. E quando lhe alteram a natureza, reage mal, quando se procura ‘civilizá-lo’, descaracteriza-se, não atinge os objectivos que lhe atribuem: eficácia, crescimento, acumulação,... As crises são a única saída!

Porque o produtivismo que apregoa alimenta-se do consumismo que diz (?) repudiar! Perante essa anunciada reestruturação, nenhuma outra crise é necessária para que um dia destes a ‘casa’ venha mesmo abaixo! Só ainda não se sabe é quando!

segunda-feira, 2 de maio de 2011

A estratégia do medo

Na actual crise da ‘dívida’, os únicos dois aspectos que parecem reunir consenso geral, da esquerda à direita, são os de que (1) o volume da dívida atingiu níveis incomportáveis (fruto de sucessivos déficit excessivos nas contas externas do país, ainda assim maiores os dos ‘particulares’ que os do Estado); (2) que se torna necessário, em consequência, proceder ao controle da dívida e ao reequilíbrio das contas externas (a começar pelas do OE).

A partir daqui, porém, tudo diverge: nas causas que conduziram a este descalabro financeiro e nas soluções adiantadas (ou já postas em prática) para o ultrapassar. E a análise das causas que conduziram a esta situação não é, de todo, um problema menor ou meramente académico, porque a definição das soluções mais adequadas para vencer a crise (múltipla) que daí resultou, requer o conhecimento completo das condições objectivas e subjectivas do que lhe deu origem, incluindo os próprios princípios programáticos em que se enquadra (e a produziu).

Quando um iluminado ‘guru’ liberal (António Borges) garante que a "especulação não tem tido importância nenhuma" no descalabro financeiro (e consequente resgate) de Portugal, Grécia e Irlanda, constituindo o nível actual da dívida ‘apenas’ o resultado de políticas erradas (erradas em que sentido?), é todo um programa político que ele propõe como solução. Este tipo de discurso visa um único objectivo: atribuir a responsabilidade pelo situação actual exclusivamente a factores internos, para, assim, melhor se justificar a insistência na contínua desvalorização do trabalho e na transferência de valor para o capital, mormente o dos especuladores, ‘resguardados’ por comentários tão canhestros – quanto clarificadores, diga-se.

Os meios para atingirem tal objectivo são, naturalmente, múltiplos, entre eles e sempre o recurso à ‘estratégia do medo’. Na convicção, construída por milénios de experiência, de que o medo quebra as pessoas, modera-lhes o ímpeto e destrói-lhes a vontade. Na verdade, à medida que se aproxima o dia em que será anunciado o volumoso pacote financeiro da denominada ‘ajuda’ externa (?), acentua-se o aterrador tom de intimidação sobre a natureza das medidas de austeridade que o acompanharão e lhe servirão de caução! Dos encartados especialistas aos pressurosos comentadores de serviço nos ‘media’, dos abnegados políticos aos impolutos gestores, todos pretendem dar o seu contributo pessoal para a carnificina que auguram, num exercício de prazer sádico que parece ter tomado conta das mentes bem pensantes, apostados cada um à vez em acrescentar, sobre o depoimento do anterior, maior dramatismo à situação.

O objectivo desta cáfila que se apresenta travestida de grandes sumidades é óbvio: tornar mais aceitável a austeridade real! Quanto mais negras forem as cores com que pinta a situação e mais gravosas as medidas que anuncia como inevitáveis (palavra abusada e muito desgastada!), mais resignada se espera venha a ser depois a sua aceitação pelos seus destinatários. Trata-se, no fim de contas, de uma espécie de preparação ‘pedagógica’ pelo susto, destinada a evitar acções de rejeição desta escalada de austeridade, que leve as pessoas, assim que o pacote de medidas for revelado, a desabafar, quase aliviadas: afinal podia ter sido bem pior...

Por debaixo de tanta apreensão, semblantes carregados a condizer, por vezes mesmo o rasgar de vestes clamando inocência por tamanho opróbrio pátrio (de que se dizem também vítimas), apenas uma coisa verdadeiramente os preocupa: que venha a ser posta em causa a estabilidade social, garante da comodidade das suas posições pessoais! Porque as verdadeiras vítimas (tenho-o vindo a afirmar com insistência), encontram-se sobretudo entre os que perdem o trabalho ou não o conseguem obter – num desfecho, é certo, há muito anunciado como resultado incontornável da lógica que governa o sistema... e nos desgoverna!

Agitar o medo é recurso antigo e de resultados comprovados. Tentar impor pelo medo o que não se consegue pela persuasão é, afinal, arma desde sempre utilizada e a que facilmente recorrem os poderes instalados. Muitas e variadas maneiras foram adoptadas, conforme os sítios e as pessoas, ao longo da História, indo da opressão e violência física, à coacção e violência verbal – hoje pela privilegiada utilização dos ‘media’.

Tal manipulação de sentimentos constitui, afinal, nas sociedades actuais, mais um sintoma preocupante de menorização desta democracia (supostamente governo da maioria), cada vez mais subordinada a interesses particulares e de grupo.

domingo, 1 de maio de 2011

1º de Maio


( Para ler o Manifesto : clicar AQUI )