quinta-feira, 13 de agosto de 2009

É possível o ‘desenvolvimento sustentável’ nas sociedades dominadas pelo mercado? - IV

As técnicas do Mercado ‘ao serviço’ do ambiente?!!!

O risco de a dimensão destes problemas assumir proporções irreversíveis, não obstante todo o esforço teórico desenvolvido pelos indefectíveis defensores do mercado na desvalorização do que já não pode mais ser ocultado, deixou de pertencer então à categoria de um invocado dramatismo sem fundamento, para se tornar numa realidade incontornável, impossível de ignorar pelos responsáveis políticos, porque cada vez mais presente no quotidiano das pessoas comuns. Começa, pois, a ganhar forma crescente, na consciência democrática da população mundial, nomeadamente a dos países ditos desenvolvidos, a necessidade de se estabelecerem controles rígidos sobre as práticas que originam as diferentes espécies de poluição, da terrestre à atmosférica, da marítima à dos cursos de água e restantes aquíferos.

Ora, não deixa de ser sintomático e ao mesmo tempo preocupante verificar que, numa sociedade em que toda a organização social é comandada pelo poder incontestado do mercado, as soluções engendradas pelo sistema para impedir a completa anarquia existente em termos de agressões ambientais passam pelo inevitável recurso aos mesmos princípios que as originam, ou seja, os princípios mercantis:
– O princípio do ‘poluidor-pagador’ (por adaptação do utilizador-pagador), pretendendo-se que os danos causados ao ambiente sejam reparados (monetariamente, entenda-se), pelos seus directos fautores: mesmo que apenas situados no estrito âmbito deste princípio, sem o questionar, a experiência comprova que o custo a pagar pelas infracções cometidas no domínio do ambiente é amplamente compensador, confirmando que, afinal, pelo menos aqui e até agora, ‘o crime compensa’. Muito largamente, aliás...
– O mecanismo de um inconsequente ‘mercado de emissões’ internacional, criado pelo Protocolo de Quioto, por realismo político assente num equívoco e regido por normas contraproducentes (que, além do mais, ninguém cumpre): o equívoco de partir do pressuposto de uma alternativa única de modelo de desenvolvimento, ao adoptar como padrão universal e exclusivo o mercado capitalista (altamente dependente dos recursos energéticos fósseis), levando a que todos os países se sintam, legitimamente, com igual direito ao seu acesso; a norma contraproducente de pretender reduzir a produção de CO2 por conta da fixação arbitrária dos denominados ‘direitos de emissão’, estabelecidos para cada país em função dos actuais níveis de emissão, transaccionáveis como qualquer outra mercadoria, facilmente manipuláveis, em seu proveito, pelos países altamente poluidores.

O sistema assente no mercado capitalista revela assim total incapacidade para enfrentar, de forma coerente e eficaz, a ameaça crescente constituída pelas agressões ambientais (cujos resultados se expressam nas alterações climáticas), dado que se encontra demasiado dependente e comprometido com todo o processo em que elas se produzem.

Pragmaticamente, no final, o que pesa é a ausência de qualquer alternativa global tendente à urgente inversão desta situação, a nível de hipóteses teóricas e no plano da luta política, sendo que todas as energias e esforços desenvolvidos são canalizados para acções pontuais localizadas, cujos efeitos mais perduráveis se fazem sentir na lenta mentalização das pessoas envolvidas ou atingidas, no sentido da mudança de atitude e alteração de hábitos passíveis de incorporar uma nova relação com o meio ambiente. Este processo, contudo, é, por natureza, de efeitos muito lentos e limitados, pouco consentâneo com a dimensão e a urgência atingidas pelo problema. Por isso mesmo, cada vez é mais real o risco de aqui ocorrer o pior dos cenários se, à semelhança do que aconteceu ao sapo da história, o homem se for conformando com o aumento gradual do calor na Terra – até a vida, conforme a entendemos e a fruímos hoje, se tornar completamente insuportável!

Resta-nos, porventura, a egoísta esperança de tal só vir a afectar, na sua forma mais dramática, as gerações futuras. Mas então importa questionar a nossa responsabilidade social, tanto em termos do contributo para a degradação das condições que aí conduziram, quanto sobretudo a nível da consciência ética do problema. Nestas circunstâncias, não será difícil de antecipar a condenação que o pesado juízo histórico abaterá sobre a nossa revelada incapacidade para o enfrentar e resolver – quando isso ainda se demonstrava ser viável.
(...)

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