quarta-feira, 9 de julho de 2008

As alterações climáticas na política do G8

A recente e muito badalada decisão do G8 de reduzir as emissões com efeito de estufa em 50% até 2050, suscita-me alguns breves (e ligeiros, ainda que o tema mereça, como é óbvio, tratamento mais sério) comentários ‘desencontrados’:
– O primeiro, quase anedótico, é que os ‘rapazes’ do G8 parecem ter sido atraídos pela sedução dos números redondos – reduzir 50%... até ao ano 50... – o que desde logo levanta dúvidas sobre as bases em que se fundaram para chegarem a estes números quase cabalísticos!
– O segundo, ainda dentro do anedótico, é que tal objectivo mais parece ter sido fixado como se os líderes do Globo, enfadados com os constantes apelos da comunidade científica e a persistente pressão das opiniões públicas, resolvessem descartar o tema, atirando-o lá para 2050..., que é um horizonte que certamente nenhum deles espera alcançar.
– O terceiro, não obstante a pouca transparência e o anedotário deste processo, é que ele constitui de facto um começo, muito pouco ambicioso, é certo, mas que mesmo assim se arrisca a agitar as águas mornas da política internacional actual, a nível ambiental (bloqueada pela irredutível posição norte-americana) e a ultrapassar, mais cedo do que se espera, esta aparente concessão agora feita.

É claro que o Bush sabia que se o não fizesse agora, o seu sucessor (seja ele qual for), encarregar-se-ia de o fazer daqui a meia dúzia de meses e portanto, este aparente volte-face que aparece travestido de gesto de grande magnanimidade (!), mais não representa que uma antecipação estratégica. Ao decidir abrir mão, no termo do seu mandato, de uma das suas imagens de marca – de político irredutível no que ao ambiente diz respeito – atirando para daqui a mais de quarenta anos um objectivo que se sabe claramente insuficiente para resolver o problema das alterações climáticas, o que ele certamente está a tentar fazer é reduzir a margem de manobra do seu sucessor, apostando no máximo adiamento das medidas indispensáveis neste domínio.
Mas depois do precedente aberto, já vai ser muito difícil parar a dinâmica que tal abertura pode proporcionar. A questão agora é saber se, nas condições actuais de funcionamento da economia mundial, bastará uma decisão política, mesmo que tomada pela sua cúpula dirigente, para inverter o peso de uma máquina que se habituou a funcionar sozinha, sem freios nem condicionantes, ao sabor dos interesses gizados a coberto da globalização liberal.

O anedotário estratégico dos políticos e a intocável globalização liberal não auguram nada de bom. Ainda assim, abriu-se uma porta. É preciso aproveitá-la.

1 comentário:

Carlos Borges Sousa disse...

É como diz/escreve, e muito bem, em sintese:
O anedotário estratégico dos políticos e a intocável globalização liberal não auguram nada de bom.