sexta-feira, 6 de junho de 2008

II – O que une a esquerda, hoje

Fixemo-nos, por ora, nas esquerdas envolvidas, directa ou indirectamente, no referido encontro 'Agora Aqui', o que inclui o PS mas exclui, para já, a tendência conotada com o PC. Este último, provavelmente em nome de um peculiar instinto de sobrevivência social, recusa-se a fazer o luto pela morte dos faróis históricos que durante décadas lhe serviram, cegamente, de guia ideológico e a dar o indispensável salto político, sem complexos de ultrapassada supremacia, aceitando confrontar medidas e até objectivos em pé de igualdade com a restante esquerda.

Sobre o que une estas diferentes tendências reivindicando-se da esquerda e do socialismo, importa procurar ver para além do vulgar cliché que lhes atribui o propósito genérico de lutarem contra todas as desigualdades (aliás, o tema central do encontro) – diga-se, desde logo, ele próprio também objecto de profundas divergências na interpretação do que deve ser precisamente a daí resultante promoção da igualdade – por contraponto com a direita que, nessa perspectiva, privilegiaria sobretudo a defesa da liberdade.

Não cabendo neste local aprofundar estas distinções, dir-se-á apenas que, após o descalabro das fracassadas experiências de Leste, aqui se englobando o conjunto de tentativas que, em nome do socialismo, procuraram aplicar um modelo de sociedade alternativo ao proposto pelo capitalismo (da soviética, à chinesa, à jugoslava ou mesmo à cubana, a única que resiste), o que aproxima, hoje, todas estas correntes de esquerda é precisamente a afirmação, sem reservas, da liberdade como valor supremo e fundador da própria ideia de democracia. Em consonância, aliás, com a matriz ideológica herdada do ideário republicano, a clássica trilogia da liberdade, igualdade e solidariedade.

O que facilita o diálogo entre todos os intervenientes, reduz a margem de manobra dos eventuais sectarismos e torna o quadro político da esquerda bastante mais clarificador. Para a maioria, é certo, as ilusões nesses modelos alternativos haviam sido desfeitas muito antes da queda do ‘Muro’. Mas a sua rejeição, de repente tornada unânime por obra da História (não o é sempre?) permite e até facilita a construção de plataformas de entendimento que antes se afigurava tarefa impossível de conseguir.
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