segunda-feira, 19 de maio de 2008

A subida dos combustíveis

Onde se fala de ambiente e de política fiscal

A polémica instalada em torno dos escandalosos preços dos combustíveis tem várias vertentes e algumas ainda pouco exploradas. A generalidade dos comentadores e a opinião pública têm centrado a sua atenção em torno sobretudo de uma eventual cartelização dos preços (que é proibido) ou nas margens arrecadadas pelas petrolíferas (que é escandaloso, mas permitido). O debate continua crispado e sem fim à vista: os preços vão continuar a subir (com cartelização ou não), as margens das petrolíferas (e dos especuladores, já agora) vão continuar a engordar, o sistema prospera à custa do esmifranço e da miséria de muitos. Nada de novo, portanto.

Mas, tal como na discussão a propósito da crise alimentar, também aqui é possível vislumbrar um aspecto positivo neste problema e que merecia ser melhor aproveitado por parte dos políticos mais conscientes e empenhados na questão das ‘alterações climáticas’. É que os elevados preços dos combustíveis têm pelo menos o mérito de contribuir para travar o seu desenfreado consumo e de forçarem o uso mais intenso das energias alternativas, com óbvios benefícios ambientais. Subsiste, é certo, o problema imediato do seu efeito sobre a actividade produtiva, demasiado dependente do petróleo para, de um dia para o outro, se poderem esperar resultados de um eventual processo de adaptação estrutural a novas fontes energéticas.

Assim, melhor aposta que a contestação generalizada da subida dos preços, seria então pressionar o Governo no sentido da diferenciação fiscal, em benefício de determinadas actividades, por contrapartida da igualização das taxas dos combustíveis, já que actualmente o imposto sobre o gasóleo é muito mais baixo que o da gasolina, presumo que por se tratar do combustível mais utilizado na actividade produtiva (?). Contudo, alguém me sabe explicar porque razão os ‘topo de gama’ particulares abastecidos com gasóleo pagam menos imposto que um qualquer utilitário movido a gasolina?

Há muitas formas do Estado, querendo-o, poder diferenciar o preço dos combustíveis entre o consumo particular e o consumo produtivo, o que não é justo é que, para não agravar as actividades produtivas, recorra à distorção fiscal, beneficiando uma parte em prejuízo da outra. Em Espanha e muitos outros países o gasóleo ultrapassou já o preço da gasolina e não consta que lá os apertos produtivos sejam superiores aos de cá. Além do mais, dizem que isso acontece por imperativos de mercado(!) e cá, onde todos enchem a boca na sua defesa, até agora só vi zurzir (e bem, note-se, mas não basta) na eventual cartelização e no fartote de lucros das petrolíferas.

5 comentários:

José M. Sousa disse...

A questão do petróleo, para já não falar das alterações climáticas, está a ser encarada com enorme leviandade pela generalidade dos políticos, nacionais e estrangeiros. A verdade é que a sociedade industrial fundou-se no petróleo barato! Essa era ACABOU! Mas ainda continuamos em negação. É evidente que surgem os problemas de justiça relativa, mas primeiro é preciso reconhecer o problema de fundo. Para tudo é necessário energia, boa parte dos nossos bens de consumo utilizam directa ou indirectamente derivados de petróleo, inclusive o que comemos (adubos, etc.). Acontece que, como vêm avisando os mais cautelosos, a adaptação à transição para um era não dependente de petróleo exigiria décadas e muito planeamento sério, que não tem vindo a ser feito. Basta ver o caos urbano, o desordenamento do território, etc., a sistemática aposta nas infraestruturas para o automóvel, etc, etc. Daí que corremos o risco de muito brevemente assistirmos a convulsões económicas e sociais como há muito não se viam. O economista-chefe da Agência Internaciona de Energia, Fatih Birol deu uma entrevista com enorme significado. Conto traduzi-la, para que possa ser amplamente lida!

Carlos Borges Sousa disse...

Zé,
Aguardo, então e que oportunamente, publiques a entrevista de Fatih Birol da AIE no (teu) Futuro Comprometido.
CBS

José M. Sousa disse...

Eis mais um exemplo, com disparatesmonumentais!

José M. Sousa disse...

Ora cá está, na minha óptica, uma maneira inteligente de lidar politicamente com a crise dos combustíveis.

José M. Sousa disse...

ah, e comentário nos Ladrões de biclas.
Já a intervenção de F. Louçã no Parlamento pareceu-me infeliz e dá o flanco a que Sócrates responda como respondeu.